Incomodando Zagallos Paulistanos

Por Antonio Amaral, colaborador da Revista Vaidapé e estudante de Jornalismo pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

 zagallo

Manifestações estão ocorrendo com significativa frequência nos últimos dias na cidade de São Paulo. Maconha, corrupção e tarifa de transporte público são alguns dos temas colocados em pauta pela juventude. O último desses protestos gerou grande mobilização civil e repercussão tanto na mídia quanto nas redes sociais.

Em tempos em que a juventude reivindica mudanças que julgam de extrema importância para a melhoria da qualidade de vida da população, profissionais de cargos públicos entram no embalo da grande imprensa e expressam comentários absolutamente inaceitáveis em relação às manifestações.

Foi o caso de Rogério Zagallo, 1º Promotor de Justiça do 5º Tribunal do Júri, que através de palavras criminosas condenou o ato do Movimento Passe Livre (MPL-SP), em sua página pessoal no Facebook:
“Estou há 2 horas tentando voltar pra casa mais tem um bando de bugios revoltados parando a avenida Faria Lima e a Marginal Pinheiros. Por favor, alguém poderia avisar a Tropa de Choque que essa região faz parte do meu Tribunal do Júri e que se eles matarem esses filhos da puta eu arquivarei o inquérito policial. Petista de merda. Filhos da puta. Vão fazer protesto na puta que os pariu…Que saudade da época em que esse tipo de coisa era resolvida com borrachada nas costas dos medras (sic)…”

A repercussão nas redes sociais fez com que o promotor tentasse se redimir. Alegou ter apenas exagerado no nervosismo por conta do trânsito e que necessitava urgentemente buscar seus filhos, que estavam, segundo ele, esperando para serem “resgatados”.

A opinião de Zagallo não é novidade para quem transita pela classe média paulistana. O mais difícil de aturar, contudo, é o fato de que o poder público está afogado por um ideário tão retrógrado. É fato que o promotor não liga para aumento da passagem, já que ele é mais um dos que contribuem para a saturação de automóveis na capital paulistana. No trânsito, deve apenas hibernar em seu ar condicionado e nem sequer se lembra das pessoas que necessitam do transporte público para “resgatarem” seus filhos, “desacompanhados e nervosos”.

Do alto de seu poderio, Zagallo jamais se colocaria na posição de cidadão para questionar o destino do dinheiro – dos impostos e dos bilhetes – e os motivos que fazem o sistema de transporte ainda ser tão precário para a grande maioria das pessoas – não para ele, “homem da lei”.

Segundo o UOL, o preço das passagens subiu mais de 300% desde a criação do real e o aumento em questão não foi condizente com a inflação geral acumulada no período. A tarifa de ônibus custava R$ 0,65 em 1995 e, nesses 18 anos, a passagem aumentou 392%. O preço do metrô também subiu, entre 1995 e 2013, 300%. Já a inflação do período foi de aproximadamente 240%, segundo o IPCA. Isso indica que caso a tarifa de ônibus acompanhasse a inflação, o valor cobrado ficaria em torno de R$ 1,50.

O aumento de 20 centavos significa que cada uma das milhões de pessoas que utilizam o transporte público vão contribuir com uma pequena quantia para o poder público continuar enrolando a sociedade, sem valorizar motoristas e cobradores, não resolvendo o problema da qualidade do transporte e do trânsito, o qual o promotor é um dos responsáveis.

É muito fácil julgar um ato olhando para o próprio umbigo – pela postura do promotor Zagallo, isso é rotina nos tribunais pelo Brasil -, o difícil é identificar de que maneira a sociedade será afetada depois que o trânsito acabar.

Conservadores ou progressistas, somos todos cidadãos. Estamos todos expostos às decisões públicas. Quando um promotor confunde inadvertidamente a esfera pública com a esfera privada, o que nos resta é manifestar o descontentamento, ir às ruas, ocupar as avenidas. Se parar o trânsito for preciso, que seja feito. E que cada dia mais os Zagallos paulistanos sejam incomodados, se atentando para o coletivo e não somente ao próprio bem estar.

2 responses to “Incomodando Zagallos Paulistanos

  1. Tonico, ficamos emocionados com seu texto, lúcido reflexivo e direto ao ponto. ” nem sequer se lembra das pessoas que necessitam do transporte público para “resgatarem” seus filhos, “desacompanhados e nervosos”.” Perfeito!! E o último parágrafo, um primor. Estamos muito orgulhosos de vc! Verinha e Pedro

  2. “se eles (oo policiais) matarem… eu arquivarei o inquérito…”
    Será q ninguém vai se dar conta da gravidade de um Promotor declarar (publicamente!) a disposição de cometer (entre outras coisas) um ilícito penal?

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